Durante cinco anos, o grupo Volkswagen terá sido infiltrado e espionado por hackers chineses suspeitos de terem sido empregues pelo Estado.
O caso só ressurgiu recentemente, mas tem ramificações que remontam ao início dos anos 2000. E o grupo alemão, o principal interessado, nunca falou abertamente sobre o que seria um grande escândalo: entre 2010 e 2015, a VW esteve ‘nas mãos’ de espiões que conseguiram penetrar nos servidores centrais do grupo germânico, onde estão armazenados os dados sensíveis sobre desenvolvimentos internos: motores, caixas de velocidade, mas também gestão eletrónica de caixas ou mesmo manuais técnicos de programação das caixas de embraiagem.
De acordo com a publicação francesa ‘L’Automobile Magazine’, o grupo Volkswagen só tomou conhecimento da violação em 2014, após atividades suspeitas na rede. O que foi tarde: de acordo com o ‘Der Spiegel’ e o canal de televisão ‘ZDF’, cerca de 19 mil ficheiros sensíveis já tinham sido roubados até à data. E não é tudo: nestes milhares de ficheiros, estavam dados cruciais sobre a eletrificação de veículos e até de células de combustível, isto numa altura em que a China preparava a sua ofensiva de veículos elétricos.
Há mais de 40 documentos internos que o ‘Der Spiegel’ conseguiu visualizar com a ‘ZDF’, que foram usados para reconstruir um ataque cibernético em grande escala e até então desconhecido contra a Volkswagen. O objetivo é claro: o hnow-how daquela que era então a maior empresa automobilística do mundo ocidental.
No entanto, a história ganha contornos ainda mais estranhos porque, de acordo com analistas de cibersegurança, o trabalho de investigação sobre os ‘IPs’ encontrados na VW acabaria por conduzir a Pequim, muito perto… do Ministério de Inteligência chinês.
Um cenário digno de um filme de Hollywodd, mas que não fez sorrir a Volkswagen, que foi obrigada a apagar dados em mais de 90 servidores após a descoberta dos factos em 2015. Os hackers conseguiram também infiltrar-se nos servidores da Volkswagens, da Audi e até da Bentley. A embaixada chinesa em Berlim já reagiu, considerando as acusações “escandalosas”.
A VW confirmou o incidente, mas ressalvou que aconteceu há dez anos, garantindo que a segurança de IT foi enormemente reforçada antes e depois. O caso foi conhecido antes da viagem do chanceler Olaf Scholz a Pequim, no passado dia 15. A Alemanha tem conhecido diversos casos de ataques cibernéticos: recentemente, o ramo automóvel da Thyssenkrupp foi hackeado, ainda que não tenha sido possível determinar a origem. Recentemente, três cidadãos alemães foram detidos sob suspeita de roubar dados altamente sensíveis de equipamento utilizado por forças navais. “Estamos conscientes do perigo considerável que a espionagem chinesa representa para os negócios, a indústria e a ciência”, confessou o ministro do Interior alemão.
Este caso veio sublinhar a capacidade de Pequim de copiar tecnologias ou processos industriais para acompanhar a histórica indústria automóvel global. Se a indústria do Japão demorou entre 30 e 40 anos para atingir o seu nível de especialização, Pequim vai demorar apenas entre 5 e 10 anos para atingir o nível competitivo contra marcas europeias, japonesas ou americanas.
“A China iniciou estes esforços significativos de eletrificação (excluindo baterias) em 2009, sendo o primeiro mercado para os alemães. Esta espionagem de 2010 a 2015 faz parte da sua estratégia para preencher as suas lacunas industriais, embora agora sejamos informados de que a China está a inundar o mercado europeu. O facto de esta notícia voltar agora não é insignificante dado este contexto de perda de velocidade de um dos pilares da economia alemã (a exportação de automóveis) e a visita de Scholz à China para o defender”, referiu Jean. -Philippe Commeignes, diretor da Tixeo.