(Mais) Transparência com as novas diretrizes europeias para a mobilidade elétrica

Opinião de Daniela Simões, co-fundadora e CEO da miio

(Mais) Transparência com as novas diretrizes europeias para a mobilidade elétrica

Por Daniela Simões, co-fundadora e CEO da miio

Todos sabemos que a mobilidade elétrica se tem afirmado como uma das grandes esperanças para a redução de emissões de gases de efeito estufa e para a promoção de uma mobilidade mais sustentável em todo o mundo. Neste contexto, a recente entrada em vigor do regulamento AFIR (Alternative Fuels Infrastructure Regulation) marca um ponto de viragem na evolução das infraestruturas de carregamento de veículos elétricos na União Europeia, incluindo em Portugal. Para quem não sabe, trata-se de um novo regulamento que visa não só reforçar a infraestrutura de carregamento, mas também melhorar significativamente a experiência do condutor de carros elétricos. Entre os seus principais objetivos, destacam-se a promoção de um serviço de pagamento simples e transparente, a disponibilização de informação em tempo real e a interoperabilidade entre diferentes redes de carregamento.

Em primeiro lugar, uma das grandes vantagens do AFIR é a obrigatoriedade da disponibilização de dados nacionais sobre a infraestrutura de carregamento. Portugal, por exemplo, já tinha implementado uma base de dados nacional abrangente, o que facilita a transição para as novas exigências. A existência de dados detalhados e acessíveis sobre a localização, disponibilidade e estado de operação dos postos de carregamento é fundamental para os utilizadores de veículos elétricos, permitindo-lhes planear as suas viagens com maior segurança e eficiência. Esta medida não só promove uma utilização mais racional das infraestruturas existentes, mas também incentiva a adoção de veículos elétricos, ao reduzir a ansiedade associada à autonomia e à disponibilidade de carregamento.

Outro ponto forte do AFIR é a introdução de um método de pagamento unificado com o cartão bancário. Atualmente, um dos maiores obstáculos enfrentados pelos utilizadores de veículos elétricos é a multiplicidade de sistemas de pagamento e de cartões específicos de operadores. Com o novo regulamento, os consumidores podem usar um cartão bancário comum para pagar os carregamentos, permitindo assim que novos utilizadores possam carregar o seu veículo e seguir viagem, mesmo sem um serviço subscrito. Esta medida é um passo importante para a universalidade no acesso ao carregamento, retirando alguma burocracia no processo, mas trará maiores custos operacionais aos intervenientes do ecossistema, retirando algumas funcionalidades que melhoravam a experiência do utilizador, como por exemplo, o acompanhamento e monitorização do estado da sessão de carregamento em tempo real e de forma remota, assim como a notificação de potenciais anomalias ou a sua recuperação.

O objetivo de te mais clareza no preço, com a indicação de este ter de ser indicado por kWh é outra das grandes vantagens trazidas pelo AFIR para o utilizador. Saber exatamente quanto custa carregar o veículo em diferentes pontos de carregamento permite uma gestão mais eficiente dos custos do utilizador e reforça a confiança dos consumidores no sistema de carregamento elétrico, incentivando a uma maior adoção dos carros elétricos. No entanto, a colocação de um preço único por kWh poderá limitar a rentabilidade dos operadores e a rotatividade nesses mesmos postos: o preço ao minuto incentiva a uma correta seleção da tomada e a uma maior consciência para remoção do veículo quando a curva de carregamento decresce significativamente, isto é, quando a bateria de começa a aproximar da sua capacidade máxima.

Este novo regulamento também tem como aspeto positivo a melhoria do acesso à rede nacional de carregamento. A expansão e densificação das infraestruturas de carregamento são essenciais para suportar o crescimento do número de veículos elétricos nas estradas. O AFIR estabelece diretrizes claras para a expansão da rede, incluindo a instalação de postos de carregamento em locais estratégicos, como as áreas urbanas, estradas principais e áreas de serviço. Este esforço coordenado visa garantir que os utilizadores de veículos elétricos tenham acesso a pontos de carregamento de forma conveniente e acessível, independentemente da localização em que se encontram.

É certo que a implementação do AFIR não está isenta de desafios e, além dos já referidos, salienta destacar o impacto nas empresas que operam no mercado de carregamento elétrico. Estas empresas terão de se adaptar às novas diretrizes, o que poderá implicar um investimento adicional significativo. A adaptação dos sistemas de pagamento, a atualização das infraestruturas existentes para garantir a interoperabilidade e a conformidade com as novas regras de transparência de preços podem, efetivamente, representar um custo considerável para os operadores. Este investimento adicional pode, a curto prazo, aumentar os custos operacionais das empresas, o que poderá refletir-se nos valores cobrados aos consumidores.

Também a necessidade de garantir a interoperabilidade entre diferentes redes de carregamento pode revelar-se um desafio técnico significativo. A harmonização de sistemas e a integração de plataformas distintas requer um esforço colaborativo entre os diferentes operadores e fornecedores de tecnologia. Esta coordenação pode ser complexa e demorada, representando um obstáculo à implementação rápida e eficiente das novas diretrizes deste regulamento.

O AFIR representa um avanço significativo para a mobilidade elétrica na União Europeia, oferecendo reais benefícios aos consumidores. No entanto, é importante reconhecer os desafios que os operadores do mercado vão enfrentar na adaptação às novas exigências. O sucesso da implementação do AFIR vai depender da colaboração entre governos, empresas e consumidores, mas o resultado promete, certamente, um futuro mais sustentável e eficiente na mobilidade elétrica.