O futuro da mobilidade será sustentável. Mas será também flexível?

Opinião de Pedro Saraiva, CEO da KINTO Portugal

O futuro da mobilidade será sustentável. Mas será também flexível?

Por Pedro Saraiva, CEO da KINTO Portugal

A mobilidade é, por natureza, o reflexo direto das várias evoluções que atravessam a sociedade, desde os avanços tecnológicos e digitais até às mudanças nas necessidades e expetativas dos cidadãos, das empresas e regulamentares, por exemplo resultantes da pressão ambiental. À medida que avançamos para um futuro cada vez mais digital e interconectado, é importante refletir sobre a evolução da mobilidade tendo em conta estes aspetos e os vários desafios e oportunidades para os próximos anos.

Nos centros urbanos, a mobilidade é responsável por 40% das emissões de CO2 de transportes rodoviários e até 70% de outros poluentes provenientes de transportes, segundo dados referidos pelo Compete 2020. A mobilidade enfrenta desafios complexos como o congestionamento, a poluição, a desigualdade e as dificuldades de acesso ao transporte. Ao comprometer a eficiência das deslocações, compromete igualmente a qualidade de vida e o bem-estar de todos os utilizadores de veículos e transportes públicos. A flexibilidade deve ser um fator-chave para contornar os desafios da articulação entre mobilidade privada e publica, através da transição para o uso crescente de veículos elétricos, híbridos ou hidrogénio e da expansão de ciclovias e o uso de bicicletas ou outros meios de micromobilidade enquanto alternativas mais limpas, bem como da disseminação do conceito de car sharing, car pooling ou do próprio aluguer de viaturas. Estas alternativas constituem uma mudança de paradigma que não só reduz o número total de veículos em circulação e/ou melhora a utilização por viatura, e em simultâneo permite que o carro seja utilizado de forma pontual, mas sempre que necessário. Um desafio muito relevante para algumas das alternativas referidas – que fomentam a formação de ecossistemas de mobilidade – é a falta de um modelo económico rentável.

Outro aspeto crucial a reter na evolução da mobilidade passa pela digitalização. As aplicações que ajudam a sugerir qual a melhor solução para deslocação em cada momento, combinadas com a facilidade de pagamentos digitais, começam a revolucionar a forma como os cidadãos se deslocam nas cidades, através de fatores como a acessibilidade, eficiência e a rapidez. Contudo, a digitalização não está isenta de desafios no que concerne às informações pessoais dos utilizadores, como a segurança dos dados e outras questões de privacidade. Mas também plena de desafios tecnológicos (na maioria dos casos as soluções tecnológicas são unidimensionais / específicas por solução). Só em algumas cidades é que já conseguimos ter aplicações em telemóvel que combinam soluções de mobilidade distintas e integradas (como é o caso de Amesterdão).

Refletindo nas tendências para o futuro, algumas opções podem transformar o cenário da mobilidade. O exemplo mais presente e conhecido é a eletrificação dos veículos, que se encontra em franca aceleração suportada por incentivos fiscais, e nos últimos anos com aumento significativo na compra de veículos elétricos, híbridos plug-in ou híbridos. A expansão das redes de carregamento rápido para responder as ansiedades dos utilizadores está a acontecer nos centros urbanos. Contudo em muitos países viajar entre cidades requer um planeamento prévio Em termos tecnológicos espera-se que a mobilidade a hidrogénio (que na verdade é mobilidade elétrica, o uso de hidrogénio liberta energia e água) tenha grande aplicabilidade para transportes de maior porte (autocarros públicos, veículos de limpeza urbana, etc) porque será muito mais eficiente do que veículos a bateria elétrica. Contudo a produção de hidrogénio e a sua distribuição são o maior desafio do momento.

Outra tendência mais disruptiva é a Mobilidade como Serviço (Mobility as a Service – MaaS). Sendo que os cidadãos, principalmente os mais jovens, pretendem estar cada vez mais livres de preocupações, este conceito visa a personalização das deslocações, conforme as necessidades diárias, e no qual os utilizadores poderão aceder a vários serviços de transportes e soluções de mobilidade numa plataforma integrada. Já existiram / existem soluções, mas que (ainda) não têm a adesão suficiente para ter sucesso, com adoção em escala.

Serão necessários vários investimentos, tanto a nível de infraestruturas como políticas de incentivo promovendo este tipo de práticas sustentáveis para alavancar a mobilidade no futuro. Este tipo de tendências deve ser encarado como uma oportunidade de melhorar não só a mobilidade nas cidades, mas também a qualidade de vida de todos os seus habitantes, promovendo uma maior flexibilidade para todos os que pretendam conduzir ou deslocar-se de forma sustentável. Haverá mais, a ciência sempre encontrou novas formas para solucionar problemas que pensávamos irresolúveis. Por exemplo, o que será e como, quando tivermos viaturas sem necessidade de condutor?